sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

Meu plano de parto e os porquês - Parte 1


*Como o assunto é extenso, vou dividi-lo em 3 posts. Essa é a parte 1. As demais serão publicadas ao longo das duas próximas semanas. Não deixe de abrir os links e complementar a leitura*



Cheguei a marca (melhoro dizendo, média) de trinta e três semanas de gestação. Eva já deve estar pesando uns 2 kilos, e seus sistemas estão cada vez mais maduros. Em pouco tempo ela trocará o calor do útero pelo calor dos braços daqueles que já amam, e para alcançarmos a linha de chegada com sucesso e eficiência, e principalmente, sem sermos trapaceados, é preciso muita preparação.
Traduzindo a analogia: Eu quero parto normal. Eu quero um parto normal no país recordista de cesárias e que passa longe da lista de exemplos de atendimento humanizado.
Pra vencer esse sistema sujo e parir minha filha dignamente, precisaremos ser verdadeiras guerreiras. Não apenas evocar força e resistência para superar a dor do parto, mas eu preciso estar empoderada ao máximo para passar por ele sem sofrer as violências obstétricas tão comuns e mascaradas que tantas mulheres são submetidas e que se quer tiveram noção disso.

Eu comecei a ler sobre basicamente tudo relacionado gravidez desde o dia que eu vi aquelas duas listras rosa. Nunca fui de me basear em achismos, lendas urbanas e historinha de vizinha, então logicamente, não começaria a agir assim agora. E foi impressionante descobrir o quão equivocada eu estava por tantos anos! Quantos mitos derrubados, quantas mentiras e informações manipuladas esclarecidas e, por fim, quantos relatos emocionantes e chocantes.
Eu fazia parte da cultura da cesária mesmo sem nem ter ambição de engravidar, e tudo por isso: falta de conhecimento sobre o assunto.

Não vou dissertar aqui sobre vias de nascimentos, prós e contras de cada um, etc. Deixarei pra um texto futuro. Minha intenção com estes três posts é mostrar (e explicar) meu plano de parto, um recurso tão simples, porém pouco popular entre as gestantes. E considerando a quantidade de comentários de mulheres (mães ou não) que foram/são ludibriadas, ou que estão preocupadas e ansiosas, ou que passaram por uma má experiência na hora de parir, este pode ser um post muito útil para sanar dúvidas, esclarecer o que poderia ter sido feito de diferente (ou recusado) para que a experiência fosse melhor, e apresentar algumas informações até então desconhecidas sobre os procedimentos médicos durante trabalho de parto, a fisiologia do corpo durante o processo e os cuidados com o bebê após o nascimento.

Antes de tudo...

"O plano de parto é uma lista de itens relacionados ao parto, sobre os quais você pensou e refletiu. Isto inclui escolher onde você quer ter seu bebê, quem vai estar presente, quais são os procedimentos médicos que você aceita e quais você prefere evitar.
Nos EUA, onde começou a ser difundido, o plano funciona como uma carta, onde a gestante diz como prefere passar pelas diversas fases do trabalho de parto e como gostaria que seu bebê fosse cuidado após o nascimento.
No entanto, acreditamos que o maior valor do plano de parto é justamente propiciar uma maior reflexão e compreensão sobre o tipo de parto que você prefere. É um exercício que pode ajudá-la a definir aquilo que é importante para você, e com esta informação em mãos, fazer com que esteja mais bem preparada para conversar com seu médico. Não se trata, portanto, de uma lista de ordens, mas de um ponto de partida para a conversa. [x]"



Trabalho de Parto:

- Presença de meu companheiro e minha Doula;

- Não quero receber toques de rotina, e eles só devem ser realizados com o meu consentimento informado;

- Sem soro com ocitocina sintética de rotina;

- Quero usar minhas próprias roupas;

- Quero poder comer alimentos energéticos (Chocolate, barras de cereal...) e beber líquidos. SEM JEJUM;

- Livre movimentação para meu conforto, não quero ficar na cama o trabalho de parto inteiro, somente quando sentir vontade;

- Uso ilimitado do chuveiro, banheira, e outras alternativas (não farmacológicas) naturais de dor (músicas, massagem, meditação, respirações, vocalização, posturas, entre outros...);

- Escutar o bebê no sonar, não cardiotoco continuamente;

- Não desejo uso de medicação para sedação , enjôo ou dor.

- Não desejo analgesia / anestesia de parto. Se eu achar necessário, comunicarei ao meu companheiro. Fora isso, continuarei com os métodos naturais;

- Tentar posições ou movimentos antes de iniciar o uso da ocitocina sintética (SE ASSIM, FOR NECESSÁRIO. Seja qual for a indicação);

- Não quero que rompam minha bolsa;

- Quero poder fotografar e filmar;

- Quero ter a liberdade de ouvir músicas quando sentir vontade, acender ou apagar as luzes, abrir ou fechar as portas e janelas;

- Não quero responder perguntas durante o trabalho de parto;

- Não quero fazer lavagem intestinal;

- Não quero que seja feita a raspagem dos pêlos pubianos no hospital (Tricotomia NÃO.)



Muita gente não sabe - e muitos hospitais ignoram -, mas existe uma lei desde 1990 que obriga os serviços de saúde do SUS, da rede própria ou conveniada a permitir a presença de 1 acompanhante durante todo o período de trabalho de parto, parto e pós-parto imediato. No meu caso, este acompanhante será o Ian.
Na maternidade de minha escolha (Maria Amélia de Holanda Albuquerque, Centro do Rio), eles permitem também a permanência de uma doula, que para quem desconhece o termo, se trata de uma profissional que dá suporte físico e emocional a outras mulheres antes, durante e após o parto.

"O que a doula faz?
Antes do parto - ela orienta o casal sobre o que esperar do parto e pós-parto. Explica os procedimentos comuns e ajuda a mulher a se preparar, física e emocionalmente para o parto, das mais variadas formas.
Durante o parto - a doula funciona como uma interface entre a equipe de atendimento e o casal. Ela explica os complicados termos médicos e os procedimentos hospitalares e atenua a eventual frieza da equipe de atendimento num dos momentos mais vulneráveis de sua vida. Ela ajuda a parturiente a encontrar posições mais confortáveis para o trabalho de parto e parto, mostra formas eficientes de respiração e propõe medidas naturais que podem aliviar as dores, como banhos, massagens, relaxamento, etc..
Após o parto - ela faz visitas à nova família, oferecendo apoio para o período de pós-parto, especialmente em relação à amamentação e cuidados com o bebê." [x]


Felizmente então eu também terei a companhia dessa fada madrinha gestacional, a querida Mell, no hospital. (Até porque, preciso de alguém com vida no quarto. O Ian provavelmente já vai ter parido o intestino antes deu conseguir parir a Eva, rs).

Seguindo, vem duas práticas de rotina que a grande maioria das mulheres são submetidas nos hospitais. Ambas, quase sempre, são realizadas de maneira mecânica e sem consentimento da gestante - até porque, essa nem deve saber que tal procedimento é dispensável ou não precisa ser feito tão excessivamente. 

O soro de ocitocina artificial é, principalmente, usado para acelerar as contrações. Para o hospital e a equipe que realiza o parto, isso é ótimo, e você até pode pensar que pra você também. "Ué, acelerar as contrações não significa que o trabalho de parto vai ser mais curto?" Não necessariamente.

"O problema quanto à ocitocina sintética é que não há meios precisos para medir seus efeitos no útero e a ação de uma mesma dose da droga varia de uma mulher para outra, o que pode levar a aumento excessivo da frequência das contrações e prejuízos para o bebê. “A indução e o aceleramento artificial das contrações sem uma indicação precisa podem resultar em dificuldades na oxigenação do bebê e dano cerebral no recém-nascido”, diz a ginecologista e obstetra Maria Helena Bastos, consultora nacional em saúde da mulher da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas). “Além disso, o uso de ocitocina causa dor e sofrimento desnecessários à mulher" [x]



Vale lembrar que o corpo da mulher produz ocitocina naturalmente, o mesmo hormônio que geralmente está ligado ao prazer (como sexo, beijo, abraço, etc), já o "sorinho"é artificial, fabricado e torna as contrações mais dolorosas,  Então, não, muito obrigada, doutor. Dispenso.
E certamente eu também dispenso os exames de toque compulsivos, por motivos de ser desconfortável, invasivo, pode me deixar mais aflita do que aliviada, aumenta os riscos de infecção, etc. 

Sabe-se que cada mulher tem um ritmo diferente, que cada corpo tem sua forma de trabalhar embora trabalhem para chegar a um mesmo fim. Tem quem fique 4 horas em trabalho de parto, como tem quem fica 40! Não tem regra, padrão, "normal".
Como quase tudo nos procedimentos médicos, o toque acaba gerando uma pressão no psicológico da mulher, e o nervosismo pode acabar bloqueando e prolongando o processo. Angustiada e duvidando de si, a mulher fica mais suscitável a outras intervenções, ou pedir/aceitar uma cesária desnecessária.

"Hoje, diretrizes e protocolos de vários lugares do mundo recomendam: os toques devem ser realizados somente quando necessários e é desejável realizá-los com a menor frequência possível. Nada de toque de hora em hora ou a cada duas horas, de rotina" [x]

Agora pensa comigo: você enfrenta horas (e podem ser muitas horas) de desconforto e precisará de força e energia para tanto esforço físico. E como isso é possível sem se alimentar e se hidratar? Pois é. O pensamento lógico já explica o porquê da ideia do jejum ser tão idiota.
Vale explicar que a recomendação se dá a caso ao risco da mulher aspirar o vômito que poderia ocorrer se ela for anestesiada. No entanto, 1) pra isso, teria que ser anestesia geral, que 2) não acontece no parto normal e 3) é cada vez menos realizado na cesárea.

"De acordo com alguns autores, a chance de uma mulher morrer asfixiada por não ter feito jejum durante o parto é de uma em SETENTA MILHÕES! (...) Pra se ter idéia do quão insignificante é o risco, a chance de morrer em um acidente de automóvel é de 1 em 85. Já a chance de morrer em um acidente de avião é de 1 em 5.862." [x]

Não estou falando que quero bater um pratão de comida durante o trabalho de parto, até porque, é comum a mulher não sentir fome, querer vomitar e evacuar, pois são reflexos naturais do corpo de se "esvaziar" para facilitar o processo. A questão é termos o direito de comer se assim quisermos! Ingerir alimentos energéticos e beber água ajuda no bem estar, que ajuda a evolução do tp.
Alias, quase todos os itens descritos nessa primeira parte foram pensados nisso, na evolução do tp, e nesse evento, a temida dor é inevitável. Assim como o sorinho, outras práticas comuns também não ajudam em nada nesse tópico, enquanto que outras tão simples e naturais (e que sairiam mais barato) podem tornar a coisa bem mais suportável. É o caso das massagens, exercícios na bola suíça, banhos, a climatização do ambiente e a livre movimentação.

Caminhar e rebolar, por exemplo, ajudam bastante a estimular a dilatação e no relaxamento das articulações e da pelve! (não, eles não deixam você deitada da hora que chega até parir porque se comovem com sua dor e cansaço)
Entende-se que o tp é desgastante e a dor incomoda, por isso listei meu desejo em experimentar alternativas não farmacológicas para relaxar. E não tem nada a ver com ser "naturalista", hippie ou nomes do que tipo que algumas pessoas gostam de falar pra zombar. Tudo isso tem embasamento prático e científico. É mais do que comum se ter chuveiro/banheira, bola, corda, entre outros artefatos para o alívio natural, nos quartos hospitalares em países desenvolvidos.
"Exatamente, Ingrid, países desenvolvidos! Aqui não é Holanda". Beleza. Mas você não precisa ficar só dependendo da boa vontade da maternidade. Você mesma pode comprar uma bola, e se não tiver uma doula, pode encontrar na internet técnicas de vocalização, dicas de exercícios, seu acompanhante pode aprender as massagens, etc.. Portanto, sem moleza, meninas. Descansem sim, e se conseguirem, durmam com certeza! mas se estiver com energia e vontade, movimente-se; Ajude seu corpo!

Voltando a questão das intervenções desnecessárias e rotineiras, chegamos a uma das minhas preferidas na lista "gerador de equívocos": a bolsa.
Nesse caso, eu acho que as produções cinematográficas e novelas tem grande parte da culpa, afinal, a cena é clássica: a mulher está lá fazendo alguma coisa e do nada a bolsa estoura, começa uma agitação generalizada, correm com ela para o hospital e dez minutos depois ela aparece com o bebê no colo.

"Quando a bolsa se rompe antes de qualquer outro sinal de trabalho de parto, isso pode ser um sinal de alerta, pelo fato do bebê não ter mais a sua proteção natural contra as bactérias externas. Por isso, a maioria dos obstetras aplicará um antibiótico de maneira profilática a partir de 12h de bolsa rota, para assegurar não ocorra uma infecção, e monitorará de perto a temperatura materna e o bem estar fetal. Com a rotura da bolsa, e a consequente saída do líquido amniótico, cria-se um movimento de vácuo no útero, que puxa a cabeça do bebê para baixo. A cabeça faz um efeito de "rolha" e impede que o líquido saia por completo. No momento em que a bolsa estoura, se o líquido que estiver saindo for abundante, é recomendável sentar-se um pouco para evitar que o cordão saia junto com o movimento do líquido e seja prensado pela cabeça, comprometendo a circulação e causando um sofrimento fetal.
Depois do rompimento da bolsa, o líquido continua sendo produzido normalmente pela placenta, até o nascimento do bebê.
(...) Na grande maioria dos casos, a bolsa amniótica só se rompe depois que a mulher já entrou em trabalho de parto e está sentindo contrações regularmente. A rotura da bolsa pode acontecer a qualquer momento do parto, mas tende a acontecer, naturalmente, quando a mulher já está na fase de transição e começando a sentir os primeiros puxos." [x]


Causar o rompimento da bolsa artificialmente tem tantos riscos que eu não consigo nem entender como um "profissional" expõe o bebê a tal procedimento só pra acelerar o tp - que é o principal motivador para tal prática. Sem uma real necessidade, isso não é só uma violência obstétrica, mas também negligência.
AH! Pode acontecer também de não acontecer, ou seja, o bebê nascer empelicado (dentro da bolsa). É um pouco raro, porém, não é motivo de preocupação. Tudo ocorre normalmente, bastando remover a bolsa depois que o bebê nasce.



Portanto, meninas, só vale "correr" pro hospital se realmente a bolsa estoura antes de qualquer outro

sinal de trabalho de parto.
Caso você esteja em pródromos (contrações irregulares doloridas ou não, dores nas costas, perda do tampão mucoso, etc) e o rompimento aconteça, pode levar ainda algum tempo até o trabalho de parto ativo, e ainda maaaais tempo até a fase de transição, que é quando o colo do útero está dilatando entre 8 e 10 centímetros. Antes disso aí, seu bebê não vai nascer, então tipo, relaxa. Não faz a louca.
Se internar antes de entrar em trabalho de parto ativo (contrações durando cerca de 1 minuto a cada 3 minutos, e o colo do útero está entre 4 e 7 centímetros de dilatação) é pedir pra sofrer intervenções, que é pedir pra ter um parto mais sofrido.
Enfim.

Fechando o quadro dos procedimentos descartáveis desta parte 1, tem alguns itens mais tranquilos, mas que deveriam ser realizados apenas a pedido da gestante: a lavagem intestinal e a raspagem dos pelos pubianos.
Eu escolhi não passar por nenhum dos dois por motivos bem simples: ambos são desconfortáveis e não necessariamente acrescentam algum benefício.
Alias, o único motivador pró que eu encontraria é o "visual". É cultural no Brasil que a mulher mantenha a vagina quase que completamente livre, ou totalmente livre, de pelos. É tipo um sinônimo de higiene por aqui. Não vou debater isso, mas...

"Em relação a outras práticas condenadas pela OMS, a epidemiologista explica, por exemplo, que a raspagem dos pelos faz aumentar o risco de infecção materna, pois o procedimento também retira a camada que protege a pele de bactérias. Já a lavagem intestinal gera risco de contaminação do bebê, devido aos resquícios de água e fezes que podem permanecer no intestino e ser mais facilmente liberados durante o parto por estarem no estado líquido.." [x]

Ou seja. Não vou chegar no hospital com uma moita, até porque como eu já disse, temos uma certa cultura quanto a isso. Como a maioria, eu mantenho uma higienização diária, com cuidados e preferências específicas nessa região, o que torna então esse procedimento desnecessário no ambiente hospitalar. Eu cuido disso em off, muito obrigada.
O mesmo acontece em relação a lavagem. O trabalho de parto não nos impossibilita de evacuar normalmente, muito pelo contrário. E mesmo fazendo isso, o que não falta é história de mamãe que deixou alguma coisa escapar durante o expulsivo. É equinha? É. Tanto que eu sempre brinco falando que talvez meu maior "medo" é  o de fazer cocô quando parir, mas eu entendo que é completamente normal. Frescuras à parte, eu tenho bom senso.

(...)


Previsão para a parte dois: 20/01

2 comentários:

  1. Estou na 31ª semana. A cada dia a ansiedade aumenta mais. Não tenho um plano de parto escrito, mas já fui a maternidade onde pretendo ter meu bebê (que não quis de forma alguma revelar seu sexo) e conversei sobre todos esses procedimentos. Dia 26 retornarei lá, desta vez com maridinho (que se chama Yan kkkkk) para fazermos um "tour" pela maternidade, conhecer os quartos de parto normal, ver os procedimentos realizados com bebês que nascem de parto normal e com cesária (embora a maternidade escolhida por nós tenha cerca de 90% de seus partos sendo realizados de forma normal. Um dos motivos para a escolha), conversar com os obstetras e com as parteiras... Decidi ter parto normal por ser uma recuperação mais rápida para mim e ser muito melhor para a saúde de meu pequeno. Espero que corra tudo bem para você e para mim também hehe.
    Beijos

    http://vidasempretoebranco.blogspot.com

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  2. Ingrid. Adorei seu post, e estamos seguindo pelo mesmo caminho. Eu também já fiz meu plano de parto, e estou aguardando a resposta da maternidade que escolhi para ter meu João Lucas. já estou de 37 semanas, me exercitando, e caminhando para que eu possa ter uma boa dilatação. nossos planos são parecidos, e eu também não quero a grande maioria das intervenções médicas, por acreditar que o corpo tem a sua hora certa de espulsar o bebê do utero, tem suas maneiras para evitar a dor, sem precisarmos passar por procedimentos disnecessários.
    http://supperandoopreconseito.blogspot.com

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